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O QUARTO MANDAMENTO




«Honra pai e mãe, a fim de prolongares os teus dias na terra que o Senhor
teu Deus te vai dar» (Ex 20, 12).
«Era-lhes submisso» (Lc 2, 51).
O próprio Senhor Jesus lembrou a força deste «mandamento de Deus» (1). E o
Apóstolo ensina: «Filhos, obedecei aos vossos pais, no Senhor, pois é isso que é
justo. "Honra pai e mãe" – tal é o primeiro mandamento, com uma promessa "para
que sejas feliz e gozes de longa vida sobre a terra"» (Ef 6, 1-3) (2).
2197. O quarto mandamento é o primeiro da segunda tábua, e indica a ordem da
caridade. Deus quis que, depois de Si, honrássemos os nossos pais, a quem
devemos a vida e que nos transmitiram o conhecimento de Deus. Temos obrigação
de honrar e respeitar todos aqueles que Deus, para nosso bem, revestiu da sua
autoridade.
2198. Este mandamento exprime-se sob a forma positiva de deveres a cumprir.
Anuncia os mandamentos seguintes, relativos ao respeito particular pela vida,
pelo matrimónio, pelos bens terrenos, pela palavra dada. E constitui um dos
fundamentos da doutrina social da Igreja.
2199. O quarto mandamento dirige-se expressamente aos filhos nas suas relações
com o pai e a mãe, porque esta relação é a mais universal. Mas diz respeito
igualmente às relações de parentesco com os membros do grupo familiar. Exige
que se preste honra, afeição e reconhecimento aos avós e antepassados. E, enfim,
extensivo aos deveres dos alunos para com os professores, dos empregados para
com os patrões, dos subordinados para com os chefes e dos cidadãos para com a
pátria e para com quem os administra ou governa.
Este mandamento implica e subentende os deveres dos pais, tutores, professores,
chefes, magistrados, governantes, todos aqueles que exercem alguma autoridade
sobre outrem ou sobre uma comunidade de pessoas.
2200. A observância do quarto mandamento comporta a respectiva recompensa:
«Honra pai e mãe, a fim de prolongares os teus dias na terra que o Senhor teu
Deus te vai dar» (Ex 20, 12) (3). O respeito por este mandamento proporciona, com
os frutos espirituais, os frutos temporais da paz e da prosperidade. Pelo contrário,
a sua inobservância acarreta grandes danos às comunidades e às pessoas
humanas.

I. A família no plano de Deus

NATUREZA DA FAMÍLIA
2201. A comunidade conjugal assenta sobre o consentimento dos esposos. O
matrimónio e a família estão ordenados para o bem dos esposos e para a
procriação e educação dos filhos. O amor dos esposos e a geração dos filhos
estabelecem, entre os membros duma mesma família, relações pessoais e
responsabilidades primordiais.
2202. Um homem e uma mulher, unidos em matrimónio, formam com os seus filhos
uma família. Esta disposição precede todo e qualquer reconhecimento por parte da
autoridade pública e impõe-se a ela. Deverá ser considerada como a referência
normal, em função da qual serão apreciadas as diversas formas de parentesco.
2203. Ao criar o homem e a mulher, Deus instituiu a família humana e dotou-a da
sua constituição fundamental. Os seus membros são pessoas iguais em dignidade.
Para o bem comum dos seus membros e da sociedade, a família implica uma
diversidade de responsabilidades, de direitos de deveres.
A FAMÍLIA CRISTÃ
2204. «A família cristã constitui uma revelação e uma realização específica da
comunhão eclesial; por esse motivo [...], há-de ser designada como uma igreja
doméstica» (4). Ela é uma comunidade de fé, de esperança e de caridade: revestese
duma importância singular na Igreja, como transparece do Novo Testamento
(5).
2205. A família cristã é uma comunhão de pessoas, vestígio e imagem da
comunhão do Pai e do Filho, no Espírito Santo. A sua actividade procriadora e
educativa é o reflexo da obra criadora do Pai. É chamada a partilhar da oração e
do sacrifício de Cristo. A oração quotidiana e a leitura da Palavra de Deus
fortalecem nela a caridade. A família cristã é evangelizadora e missionária.
2206. As relações no seio da família comportam uma afinidade de sentimentos, de
afectos e de interesses, que provêm sobretudo do mútuo respeito das pessoas. A
família é uma comunidade privilegiada, chamada a realizar a comunhão das almas,
o comum acordo dos esposos e a diligente cooperação dos pais na educação dos
filhos (6).

II. A família e a sociedade

2207. A família é a célula originária da vida social. É ela a sociedade natural em
que o homem e a mulher são chamados ao dom de si no amor e no dom da vida. A
autoridade, a estabilidade e a vida de relações no seio da família constituem os
fundamentos da liberdade, da segurança, da fraternidade no seio da sociedade. A
família é a comunidade em que, desde a infância, se podem aprender os valores
morais, começar a honrar a Deus e a fazer bom uso da liberdade. A vida da família
é iniciação à vida em sociedade.
2208. A família deve viver de modo que os seus membros aprendam a preocuparse
e a encarregar-se dos jovens e dos velhos, das pessoas doentes ou incapacitadas
e dos pobres. São muitas as famílias que, em certos momentos, se não encontram
em condições de prestar esta ajuda. Recai então sobre outras pessoas, outras
famílias e, subsidiariamente, sobre a sociedade, o dever de prover a estas
necessidades: «A religião pura e sem mancha, aos olhos de Deus nosso Pai,
consiste em visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e conservar-se limpo
do contágio do mundo» (Tg 1, 27).
2209. A família deve ser ajudada e defendida por medidas sociais apropriadas. Nos
casos em que as famílias não estiverem em condições de cumprir as suas funções,
os outros corpos sociais têm o dever de as ajudar e de amparar a instituição
familiar. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade, as comunidades mais vastas
abster-se-ão de lhe usurpar as suas prerrogativas ou de se imiscuir na sua vida.
2210. A importância da família na vida e no bem-estar da sociedade (7) implica
uma responsabilidade particular desta no apoio e fortalecimento do matrimónio e
da família. A autoridade civil deve considerar como seu grave dever «reconhecer e
proteger a verdadeira natureza do matrimónio e da família, defender a
moralidade pública e favorecer a prosperidade doméstica» (8).
2211. A comunidade política tem o dever de honrar a família, de a assistir e de
nomeadamente lhe garantir:
– a Liberdade de fundar um lar, ter filhos e educá-Los de acordo com as suas
próprias convicções morais e religiosas;
– a protecção da estabilidade do vínculo conjugal e da instituição familiar;
– a liberdade de professar a sua fé, de a transmitir, de educar nela os seus filhos,
com os meios e as instituições necessárias;
– o direito à propriedade privada, a liberdade de iniciativa, de obter um trabalho,
uma habitação e o direito de emigrar;
– consoante as instituições dos países, o direito aos cuidados médicos e à
assistência aos idosos, bem como ao abono de família;
– a protecção da segurança e da salubridade, sobretudo no que respeita a perigos
como a droga, a pornografia, o alcoolismo. etc.;
– a liberdade de formar associações com outras famílias e de ter assim
representação junto das autoridades civis (9).
2212. O quarto mandamento esclarece as outras relações na sociedade. Nos nossos
irmãos e irmãs vemos os filhos dos nossos pais; nos nossos primos, os descendentes
dos nossos avós; nos nossos concidadãos, os filhos da nossa pátria; nos baptizados,
os filhos da nossa mãe Igreja; em toda a pessoa humana, um filho ou filha d'Aquele
que quer ser chamado «nosso Pai». Daí que as nossas relações com o próximo
sejam reconhecidas como de ordem pessoal. O próximo não é um «indivíduo» da
colectividade humana; é «alguém» que, pelas suas origens conhecidas, merece
uma atenção e um respeito singulares.
2213. As comunidades humanas são compostas de pessoas. O bom governo das
mesmas não se limita à garantia dos direitos e ao cumprimento dos deveres, bem
como ao respeito pelos contratos. Relações justas entre patrões e empregados,
governantes e cidadãos, pressupõem a benevolência natural, de acordo com a
dignidade das pessoas humanas, solícitas pela justiça e pela fraternidade.

III. Deveres dos membros da família

DEVERES DOS FILHOS
2214. A paternidade divina é a fonte da paternidade humana (10); nela se
fundamenta a honra devida aos pais. O respeito dos filhos, menores ou adultos,
pelo seu pai e pela sua mãe (11) nutre-se do afecto natural nascido dos laços que
os unem. Exige-o o preceito divino (12).
2215. O respeito pelos pais (piedade filial) é feito de reconhecimento àqueles que,
pelo dom da vida, pelo seu amor e seu trabalho, puseram os filhos no mundo e lhes
permitiram crescer em estatura, sabedoria e graça. «Honra o teu pai de todo o
teu coração e não esqueças as dores da tua mãe. Lembra-te de que foram eles que
te geraram. Como lhes retribuirás o que por ti fizeram?»(Sir 7, 27-28).
2216. O respeito filial revela-se na docilidade e na obediência autênticas.
«Observa, meu filho, as ordens do teu pai, e não desprezes os ensinamentos da tua
mãe [...]. Servir-te-ão de guia no caminho, velarão por ti quando dormires, e
falarão contigo ao despertares» (Pr 6, 20.22). «O filho sábio é fruto da correcção
paterna, mas o insolente não aceita a repreensão» (Pr 13, 1).
2117. Enquanto viver na casa dos pais, o filho deve obedecer a tudo o que eles lhe
mandarem para seu bem ou o da família. «Filhos, obedecei em tudo aos vossos
pais, porque isto agrada ao Senhor» (Cl 3, 20) (13). Os filhos devem também
obedecer às prescrições razoáveis dos seus educadores e de todos aqueles a quem
os pais os confiaram. Mas se o filho se persuadir, em consciência, de que é
moralmente mau obedecer a determinada ordem, não o faça.
Com o crescimento, os filhos continuarão a respeitar os pais. Adivinharão os
seus desejos,pedirão de boa vontade os seus conselhos e aceitarão as suas
admoestações justificadas. A obediência aos pais cessa com a emancipação: mas
não o respeito que sempre lhes é devido. É que este tens a sua raiz no temor de
Deus, que é um dos dons do Espírito Santo.
2218. O quarto mandamento lembra aos filhos adultos as suas responsabilidades
para com os pais. Tanto quanto lhes for possível, devem prestar-lhes ajuda
material e moral, nos anos da velhice e no tempo da doença, da solidão ou do
desânimo. Jesus lembra este dever de gratidão (14).
«Deus quis honrar o pai pelos filhos e cuidadosamente firmou sobre eles a
autoridade da mãe. O que honra o pai alcança o perdão dos seus pecados e quem
honra a mãe é semelhante àquele que acumula tesouros. Quem honra o pai
encontrará alegria nos seus filhos e será ouvido no dia da sua oração. Quem honra
o pai gozará de longa vida e quem lhe obedece consolará a sua mãe» (Sir 3, 2-6).
«Filho, ampara o teu pai na velhice, não o desgostes durante a sua vida. Mesmo
se ele vier a perder a razão, sê indulgente, não o desprezes, tu que estás na
plenitude das tuas forças [...]. É como um blasfemador o que desampara o seu pai e
é amaldiçoado por Deus aquele que irrita a sua mãe» (Sir 3, 12-16).
2219. O respeito filial favorece a harmonia de toda a vida familiar; engloba
também as relações entre irmãos e irmãs. O respeito pelos pais impregna todo o
ambiente familiar. «A coroa dos anciãos são os filhos dos seus filhos» (Pr 17, 6).
«Suportai-vos uns aos outros na caridade, com toda a humildade, mansidão e
paciência» (Ef 4, 2).
2220. Os cristãos, têm o dever de ser especialmente gratos àqueles de quem
receberam o dom da fé, a graça do Baptismo e a vida na Igreja. Pode tratar-se dos
pais, de outros membros da família, dos avós, dos pastores, dos catequistas, dos
professores ou amigos. «Conservo a lembrança da tua fé tão sincera, que foi
primeiro a da tua avó Lóide e da tua mãe Eunice, e que, estou certo, habita
também em ti» (2 Tm 1, 5).
DEVERES DOS PAIS
2221. A fecundidade do amor conjugal não se reduz apenas à procriação dos filhos.
Deve também estender-se à sua educação moral e à sua formação espiritual.
O «papel dos pais na educação é de tal importância que é impossível substituí-los»
(15). O direito e o dever da educação são primordiais e inalienáveis para os país
(16).
2222. Os pais devem olhar para os seus filhos como filhos de Deus e respeitá-los
como pessoas humanas. Educarão os seus filhos no cumprimento da lei de Deus, na
medida em que eles próprios se mostrarem obedientes à vontade do Pai dos céus.
2223. Os pais são os primeiros responsáveis pela educação dos filhos.
Testemunham esta responsabilidade, primeiro pela criação dum lar onde são regra
a ternura, o perdão, o respeito, a fidelidade e o serviço desinteressado. O lar é um
lugar apropriado para a educação das virtudes,a qual requer a aprendizagem da
abnegação, de sãos critérios, do autodomínio, condições da verdadeira liberdade.
Os pais ensinarão os filhos a subordinar «as dimensões físicas e instintivas às
dimensões interiores e espirituais» (17). Os pais têm a grave responsabilidade de
dar bons exemplos aos filhos. Sabendo reconhecer diante deles os próprios
defeitos, serão mais capazes de os guiar e corrigir:
«Aquele que ama o seu filho, castiga-o com frequência [...]. Aquele que dá
ensinamentos ao seu filho será louvado» (Sir 30, 1-2). «E vós, pais, não irriteis os
vossos filhos: pelo contrário, educai-os com disciplina e advertências inspiradas
pelo Senhor» (Ef 6, 4).
2224. O lar constitui o âmbito natural para a iniciação da pessoa humana na
solidariedade e nas responsabilidades comunitárias. Os pais devem ensinar os
filhos a acautelar-se dos perigos e degradações que ameaçam as sociedades
humanas.
2225. Pela graça do sacramento do matrimónio, os pais receberam a
responsabilidade e o privilégio de evangelizar os filhos. Desde tenra idade devem
iniciá-los nos mistérios da fé, de que são os «primeiros arautos» (18). Hão-de
associá-los, desde a sua primeira infância, à vida da Igreja. A maneira como se vive
em família pode alimentar as disposições afectivas, que durante toda a vida
permanecem como autêntico preâmbulo e esteio duma fé viva.
2226. A educação da fé por parte dos pais deve começar desde a mais tenra
infância. Faz-se já quando os membros da família se ajudam mutuamente a crescer
na fé pelo testemunho duma vida cristã, de acordo com o Evangelho. A catequese
familiar precede, acompanha e enriquece as outras formas de ensinamento da fé.
Os pais têm a missão de ensinar os filhos a rezar e a descobrir a sua vocação de
filhos de Deus (19). A paróquia é a comunidade eucarística e o coração da vida
litúrgica das famílias cristãs: é o lugar privilegiado da catequese dos filhos e dos
pais.
2227. Por sua vez, os filhos contribuem para o crescimento dos seus pais na
santidade (20). Todos e cada um se darão, generosamente e sem se cansar, o
perdão mútuo exigido pelas ofensas, querelas, injustiças e abandonos. Assim o
sugere o afecto mútuo. E assim o exige a caridade de Cristo (21).
2228. Durante a infância, o respeito e o carinho dos pais traduzem-se, primeiro, no
cuidado e na atenção que consagram à educação dos filhos, para prover as suas
necessidades, físicas e espirituais. A medida que vão crescendo, o mesmo respeito
e dedicação levam os pais a educar os filhos no sentido dum uso correcto da sua
razão e da sua liberdade.
2229. Como primeiros responsáveis pela educação dos seus filhos, os pais têm o
direito deescolher para eles uma escola que corresponda às suas próprias
convicções. É um direito fundamental. Tanto quanto possível, os pais têm o dever
de escolher as escolas que melhor os apoiem na sua tarefa de educadores cristãos
(22). Os poderes públicos têm o dever de garantir este direito dos pais e de
assegurar as condições reais do seu exercício.
2230. Ao tornarem-se adultos, os filhos têm o dever e o direito de escolher a sua
profissão e o seu estado de vida. Devem assumir as novas responsabilidades numa
relação de confiança com os seus pais, a quem pedirão e de quem de boa vontade
receberão opiniões e conselhos. Os pais terão o cuidado de não constranger os
filhos, nem na escolha duma profissão, nem na escolha do cônjuge. Mas este dever
de discrição não os proíbe, muito pelo contrário, de os ajudar com opiniões
ponderadas, sobretudo quando tiverem em vista a fundação dum novo lar.
2231. Há quem não se case para cuidar dos pais ou dos irmãos e irmãs; ou para se
dedicar mais exclusivamente a uma profissão; ou ainda por outros motivos válidos.
Esses podem contribuir muitíssimo para o bem da família humana.

IV. A família e o Reino

2232. São importantes, mas não absolutos, os laços familiares. Quanto mais a
criança cresce para a maturidade e autonomia humanas e espirituais, tanto mais a
sua vocação individual, que vem de Deus, se afirma com nitidez e força. Os pais
devem respeitar este chamamento e apoiar a resposta dos filhos para o seguir.
Hão-de convencer-se de que a primeira vocação do cristão é seguir Jesus(23):
«Quem ama o pai ou a mãe mais do que a Mim, não é digno de Mim; e quem ama
o filho ou a filha mais do que a Mim, não é digno de Mim» (Mt 10, 37).
2233. Tornar-se discípulo de Jesus é aceitar o convite para pertencer à família de
Deus, para viver em conformidade com a sua maneira de viver: «Todo aquele que
fizer a vontade do meu Pai que está nos céus, é que é meu irmão e minha irmã e
minha mãe» (Mt 12, 50).
Os pais devem acolher e respeitar, com alegria e acção de graças, o chamamento
que o Senhor fizer a um dos seus filhos, para O seguir na virgindade pelo Reino, na
vida consagrada ou no ministério sacerdotal.

V. As autoridades na sociedade civil

2234. O quarto mandamento da Lei de Deus manda que honremos também todos
aqueles que, para nosso bem, receberam de Deus alguma autoridade na
sociedade. E esclarece os deveres dos que exercem essa autoridade, bem como os
daqueles que dela beneficiam.
DEVERES DAS AUTORIDADES CIVIS
2235. Aqueles que exercem alguma autoridade, devem exercê-la como quem
presta um serviço. «Quem quiser entre vós tornar-se grande, será vosso
servo» (Mt 20, 26). O exercício da autoridade é moralmente regulado pela sua
origem divina, pela sua natureza racional e pelo seu objecto específico. Ninguém
pode mandar ou instituir o que for contrário à dignidade das pessoas e à lei
natural.
2236. O exercício da autoridade visa tornar manifesta uma justa hierarquia de
valores, a fim de facilitar o exercício da liberdade e da responsabilidade de todos.
Os superiores exerçam a justiça distributiva com sabedoria, tendo em conta as
necessidades e a contribuição de cada qual, e em vista da concórdia e da paz.
Estarão atentos a que as regras e disposições que tomam não induzam em
tentação, opondo o interesse pessoal ao da comunidade (24).
2237. Os poderes políticos são obrigados a respeitar os direitos fundamentais da
pessoa humana. Administrarão a justiça como humanidade, respeitando o direito
de cada qual, nomeadamente das famílias e dos deserdados.
Os direitos políticos inerentes à cidadania podem e devem ser reconhecidos
conforme as exigências do bem comum. Não podem ser suspensos pelos poderes
públicos sem motivo legítimo e proporcionado. O exercício dos direitos políticos
orienta-se para o bem comum da nação e da comunidade humana.
DEVERES DOS CIDADÃOS
2238. Os que estão sujeitos à autoridade considerarão os seus superiores como
representantes de Deus, que os instituiu ministros dos seus dons «Submetei-vos,
por causa do Senhor, a toda a instituição humana [...]. Procedei como homens
livres, não como aqueles que fazem da liberdade capa da sua malícia, mas como
servos de Deus» (1 Pe 2, 13.16). A sua colaboração leal comporta o direito, e às
vezes o dever, duma justa reclamação de quanto lhes parecer prejudicial à
dignidade das pessoas e ao bem da comunidade.
2239. É dever dos cidadãos colaborar com os poderes civis para o bem da
sociedade, num espírito de verdade, de justiça, de solidariedade e de liberdade. O
amor e o serviço da pátriaderivam do dever da gratidão e da ordem da caridade.
A submissão às autoridades legítimas e o serviço do bem comum exigem dos
cidadãos que cumpram o seu papel na vida da comunidade política.
2240. A submissão à autoridade e a corresponsabilidade pelo bem comum exigem
moralmente o pagamento dos impostos, o exercício do direito de voto, a defesa do
país:
«Dai a cada um o que lhe é devido: o imposto, a quem se deve o imposto; a taxa, a
quem se deve a taxa; o respeito, a quem se deve o respeito; a honra, a quem se
deve a honra» (Rm 13, 7).
Os cristãos «residem na sua própria pátria, mas vivem todos como de passagem;
em tudo participam como os outros cidadãos, mas tudo suportam como se não
tivessem pátria [...]. Obedecem às leis estabelecidas, mas pelo seu modo de vida
superam as leis [...]. Tão nobre é o posto que Deus lhes assinalou, que não lhes é
lícito desertar» (26).
O Apóstolo exorta-nos a fazer súplicas e acções de graças pelos reis e por todos
aqueles que exercem a autoridade, «a fim de que possamos ter uma vida calma e
tranquila, com toda a piedade e dignidade» (1 Tm 2, 2).
2241. As nações mais abastadas devem acolher, tanto quanto possível, o
estrangeiro em busca da segurança e dos recursos vitais que não consegue
encontrar no seu país de origem. Os poderes públicos devem velar pelo respeito
do direito natural que coloca o hóspede sob a protecção daqueles que o recebem.
As autoridades políticas podem, em vista do bem comum de que têm a
responsabilidade, subordinar o exercício do direito de imigração a diversas
condições jurídicas, nomeadamente no respeitante aos deveres que os imigrantes
contraem para com o país de adopção. O imigrado tem a obrigação de respeitar
com reconhecimento o património material e espiritual do país que o acolheu, de
obedecer às suas leis e de contribuir para o seu bem.
2242. O cidadão é obrigado, em consciência, a não seguir as prescrições das
autoridades civis, quando tais prescrições forem contrárias às exigências de ordem
moral, aos direitos fundamentais das pessoas ou aos ensinamentos do Evangelho.
A recusa de obediência às autoridades civis, quando as suas exigências forem
contrárias às da recta consciência, tem a sua justificação na distinção entre o
serviço de Deus e o serviço da comunidade política. «Dai a César o que é de César,
e a Deus o que é de Deus» (Mt 22, 21). «Deve obedecer-se antes a Deus que aos
homens»(Act 5, 29):
«Quando a autoridade pública, excedendo os limites da própria competência,
oprimir os cidadãos, estes não se recusem às exigências objectivas do bem comum;
mas é-lhes lícito, dentro dos limites definidos pela lei natural e pelo Evangelho,
defender os seus próprios direitos e os dos seus concidadãos contra o abuso dessa
autoridade» (27).
2243. A resistência à opressão do poder político não recorrerá legitimamente às
armas, senão nas seguintes condições:
1 – em caso de violações certas, graves e prolongadas dos direitos fundamentais;
2 – depois de ter esgotado todos os outros recursos;
3 – se não provocar desordens piores;
4 – se houver esperança fundada de êxito;
5 – e se for impossível prever razoavelmente soluções melhores.
A COMUNIDADE POLÍTICA E A IGREJA
2244. Toda a instituição se inspira, mesmo que implicitamente, numa visão do
homem e do seu destino, visão da qual tira as suas referências de juízo, a sua
hierarquia de valores, a sua linha de procedimento. A maior parte das sociedades
referiram as suas instituições a uma certa preeminência do homem sobre as coisas.
Só a religião divinamente revelada é que reconheceu claramente em Deus,
Criador e Redentor, a origem e o destino do homem. A Igreja convida os poderes
políticos a referenciar os seus juízos e decisões a esta inspiração da verdade sobre
Deus e sobre o homem:
As sociedades que ignoram esta inspiração ou a recusam em nome da sua
independência em relação a Deus, são levadas a procurar em si mesmas ou a
tomar de uma ideologia as suas referências e o seu fim: e não admitindo que se
defenda um critério objectivo do bem e do mal, a si mesmas atribuem, sobre o
homem e o seu destino, um poder totalitário, declarado ou oculto, como a história
tem mostrado» (31).
2245. «A Igreja que, em virtude da sua função e competência, de modo algum se
confunde com a comunidade política, [...] é, ao mesmo tempo, sinal e salvaguarda
do carácter transcendente da pessoa humana» (29). « A Igreja respeita e promove
a liberdade política e a responsabilidade dos cidadãos» (30).
2246. Faz parte da missão da Igreja «proferir um juízo moral, mesmo acerca das
realidades que dizem respeito à ordem política, sempre que os direitos
fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem utilizando todos e só
os meios conformes com o Evangelho e o bem de todos segundo a variedade dos
tempos e circunstâncias» (31).

Jesus disse aos discípulos: «Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei» (Jo 13,
34).
2196. Respondendo à questão posta sobre o primeiro dos mandamentos, Jesus
disse: «O primeiro é: "Escuta, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor.
Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo
o teu entendimento e com todas as tuas forças!". O segundo é este: "Amarás o teu
próximo como a ti mesmo". Não há outro mandamento maior do que
estes» (Mc 12, 29-31).
E o apóstolo São Paulo lembra: «Quem ama o próximo cumpre plenamente a lei.
De facto: "Não cometerás adultério, não matarás, não furtarás, não cobiçarás",
bem como qualquer outro mandamento, estão resumidos numa só frase: "Amarás
ao próximo como a ti mesmo". O amor não faz mal ao próximo. Assim, é no amor
que está o pleno cumprimento da lei» (Rm 13, 8-10).

Resumindo:
2247. «Honra pai e mãe» (Dt 5, 16; Mc 7, 10).
2248. Segundo o quarto mandamento, Deus quis que, depois d'Ele, honrássemos os
nossos pais e aqueles que, para nosso bem, Ele revestiu de autoridade.
2249. A comunidade conjugal está fundada na aliança e no consentimento dos
esposos. O matrimónio e a família estão ordenados para o bem dos cônjuges e
para a procriação e educação dos filhos.
2250. «A saúde da pessoa e da sociedade humana e cristã depende estreitamente
de uma situação favorável da comunidade conjugal e familiar» (32).
2251. Os filhos devem aos pais respeito, gratidão, obediência justa e ajuda. O
respeito filial favorece a harmonia de toda a vida familiar.
2252. Os pais são os primeiros responsáveis pela educação dos seus filhos na fé, na
oração, e em todas as virtudes. Eles têm o dever de prover, na medida do
possível, às necessidades físicas e espirituais dos seus filhos.
2253. Os pais devem respeitar e favorecer a vocação dos seus filhos. Hão-de
lembrar-se e hão-de ensinar-lhes que a primeira vocação do cristão é seguir Jesus.
2254. A autoridade pública tem a obrigação de respeitar os direitos fundamentais
da pessoa humana e as condições do exercício da sua liberdade.
2255. É dever dos cidadãos colaborar com os poderes civis na edificação da
sociedade, num espírito de verdade, justiça, solidariedade e liberdade.
2256. O cidadão está obrigado em consciência a não seguir as prescrições das
autoridades civis quando tais prescrições forem contrárias às exigências da ordem
moral. «Deve obedecer-se antes a Deus do que aos homens» (Act 5, 29).
2257. Toda a sociedade refere os seus juízos e a sua conduta a uma visão do
homem e do seu destino. Fora das luzes do Evangelho sobre Deus e sobre o
homem, as sociedades facilmente resvalam para o totalitarismo.

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