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NASCIDO DA VIRGEM MARIA

487. O que a fé católica crê, a respeito de Maria, funda-se no que crê a respeito de
Cristo. Mas o que a mesma fé ensina sobre Maria esclarece, por sua vez, a sua fé
em Cristo.
A PREDESTINAÇÃO DE MARIA
488. «Deus enviou o seu Filho» (GI 4, 4). Mas, para Lhe «formar um corpo» (129),
quis a livre cooperação duma criatura. Para isso, desde toda a eternidade, Deus
escolheu, para ser a Mãe do seu Filho, uma filha de Israel, uma jovem judia de
Nazaré, na Galileia, «virgem que era noiva de um homem da casa de David,
chamado José. O nome da virgem era Maria» (Lc1, 26-27):
«O Pai das misericórdias quis que a aceitação, por parte da que Ele predestinara
para Mãe, precedesse a Encarnação, para que, assim como uma mulher contribuiu
para a morte, também outra mulher contribuísse para a vida (130).
489. Ao longo da Antiga Aliança, a missão de Maria foi preparada pela missão de
santas mulheres. Logo no princípio, temos Eva; apesar da sua desobediência, ela
recebe a promessa duma descendência que sairá vitoriosa do Maligno(131) e de
vir a ser a mãe de todos os vivos (132). Em virtude desta promessa, Sara concebe
um filho, apesar da sua idade avançada (133). Contra toda a esperança humana,
Deus escolheu o que era tido por incapaz e fraco (134) para mostrar a sua
fidelidade à promessa feita: Ana, a mãe de Samuel (135), Débora, Rute, Judite e
Ester e muitas outras mulheres. Maria «é a primeira entre os humildes e pobres
do Senhor, que confiadamente esperam e recebem a salvação de Deus. Com ela,
enfim, excelsa filha de Sião, passada a longa espera da promessa, cumprem-se os
tempos e inaugura-se a nova economia da salvação» (136).
A IMACULADA CONCEIÇÃO
490. Para vir a ser Mãe do Salvador, Maria «foi adornada por Deus com dons
dignos de uma tão grande missão» (137). O anjo Gabriel, no momento da
Anunciação, saúda-a como «cheia de graça»(138). Efectivamente, para poder dar o
assentimento livre da sua fé ao anúncio da sua vocação, era necessário que Ela
fosse totalmente movida pela graça de Deus.
491. Ao longo dos séculos, a Igreja tomou consciência de que Maria, «cumulada de
graça» por Deus (139), tinha sido redimida desde a sua conceição. É o que confessa
o dogma da Imaculada Conceição, proclamado em 1854 pelo Papa Pio IX:
«Por uma graça e favor singular de Deus omnipotente e em previsão dos méritos
de Jesus Cristo, Salvador do género humano, a bem-aventurada Virgem Maria foi
preservada intacta de toda a mancha do pecado original no primeiro instante da
sua conceição» (140).
492. Este esplendor de uma «santidade de todo singular», com que foi
«enriquecida desde o primeiro instante da sua conceição» (141), vem-lhe
totalmente de Cristo: foi «remida dum modo mais sublime, em atenção aos
méritos de seu Filho» (142). Mais que toda e qualquer outra pessoa criada, o Pai a
«encheu de toda a espécie de bênçãos espirituais, nos céus, em Cristo» (Ef 1,
3). «N'Ele a escolheu antes da criação do mundo, para ser, na caridade, santa e
irrepreensível na sua presença» (Ef 1, 4).
493. Os Padres da tradição oriental chamam ã Mãe de Deus «a toda santa»
(«Panaghia»), celebram-na como «imune de toda a mancha de pecado, visto que o
próprio Espírito Santo a modelou e dela fez uma nova criatura» (143). Pela graça
de Deus, Maria manteve-se pura de todo o pecado pessoal ao longo de toda a
vida.
«FAÇA-SE EM MIM SEGUNDO A TUA PALAVRA...»
494. Ao anúncio de que dará à luz «o Filho do Altíssimo», sem conhecer homem,
pela virtude do Espírito Santo (144), Maria respondeu pela «obediência da fé»
(145), certa de que «a Deus nada é impossível»: «Eis a serva do Senhor, faça-se em
mim segundo a tua palavra»(Lc 1, 38). Assim, dando o seu consentimento à palavra
de Deus, Maria tornou-se Mãe de Jesus. E aceitando de todo o coração, sem que
nenhum pecado a retivesse, a vontade divina da salvação, entregou-se totalmente
à pessoa e à obra do seu Filho para servir, na dependência d'Ele e com Ele, pela
graça de Deus, o mistério da redenção (146).
«Como diz Santo Ireneu, "obedecendo, Ela tornou-se causa de salvação, para si e
para todo o género humano" (147). Eis porque não poucos Padres afirmam, tal
como ele, nas suas pregações, que "o nó da desobediência de Eva foi desatado pela
obediência de Maria; e aquilo que a virgem Eva atou, com a sua incredulidade,
desatou-o a Virgem Maria com a sua fé" (148); e, por comparação com Eva,
chamam Maria a "Mãe dos vivos" e afirmam muitas vezes: "a morte veio por Eva,
a vida veio por Maria"» (149).
A MATERNIDADE DIVINA DE MARIA
495. Chamada nos evangelhos «a Mãe de Jesus» (Jo 2, 1; 19, 25)(150), Maria é
aclamada, sob o impulso do Espírito Santo e desde antes do nascimento do seu
Filho, como «a Mãe do meu Senhor» (Lc 1, 43). Com efeito, Aquele que Ela
concebeu como homem por obra do Espírito Santo, e que Se tornou
verdadeiramente seu Filho segundo a carne, não é outro senão o Filho eterno do
Pai, a segunda pessoa da Santíssima Trindade. A Igreja confessa que Maria é,
verdadeiramente, Mãe de Deus («Theotokos») (151).
A VIRGINDADE DE MARIA
496. Desde as primeiras formulações da fé (152), a Igreja confessou que Jesus foi
concebido unicamente pelo poder do Espírito Santo no seio da Virgem Maria,
afirmando igualmente o aspecto corporal deste acontecimento: Jesus foi concebido
« absque semine, [...] ex Spiritu Sancto – do Espírito Santo, sem sémen [de
homem]» (153). Os Santos Padres vêem, na conceição virginal, o sinal de que foi
verdadeiramente o Filho de Deus que veio ao mundo numa humanidade como a
nossa:
Diz, por exemplo, Santo Inácio de Antioquia (princípio do século II): «Vós estais
firmemente convencidos, a respeito de nosso Senhor, que Ele é verdadeiramente
da raça de David segundo a carne (154). Filho de Deus segundo a vontade e o
poder de Deus (155); verdadeiramente nascido duma virgem [...], foi
verdadeiramente crucificado por nós, na sua carne, sob Pôncio Pilatos [...] e
verdadeiramente sofreu, como também verdadeiramente ressuscitou» (156).
497. As narrativas evangélicas (157) entendem a conceição virginal como uma
obra divina que ultrapassa toda a compreensão e possibilidade humanas (158): «O
que foi gerado nela vem do Espírito Santo», diz o anjo a José, a respeito de Maria,
sua esposa (Mt 1, 20). A Igreja vê nisto o cumprimento da promessa divina feita
através do profeta Isaías: «Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho» (Is 7,
14), segundo a tradução grega de Mt 1, 23.
498. Tem, por vezes, causado impressão o silêncio do Evangelho de São Marcos e
das epístolas do Novo Testamento sobre a conceição virginal de Maria Também foi
questionado, se não se trataria aqui de lendas ou construções teológicas fora do
âmbito da historicidade. A isto há que responder: a fé na conceição virginal de
Jesus encontrou viva oposição, troça ou incompreensão por parte dos não-crentes,
judeus e pagãos (159); mas não tinha origem na mitologia pagã, nem era motivada
por qualquer adaptação às ideias do tempo. O sentido deste acontecimento só é
acessível à fé. que o vê no «nexo que liga os mistérios entre si» (160), no conjunto
dos mistérios de Cristo, da Encarnação até à Páscoa. Já Santo Inácio de Antioquia
fala deste nexo: «O príncipe deste mundo não teve conhecimento da virgindade de
Maria e do seu parto, tal como da morte do Senhor: três mistérios
extraordinários, que se efectuaram no silêncio de Deus» (161).
MARIA – «SEMPRE VIRGEM»
499. O aprofundamento da fé na maternidade virginal levou a Igreja a confessar a
virgindade real e perpétua de Maria (162), mesmo no parto do Filho de Deus feito
homem (163). Com efeito, o nascimento de Cristo «não diminuiu, antes consagrou a
integridade virginal» da sua Mãe (164).
A Liturgia da Igreja celebra Maria “Aeiparthenos” como a «sempre Virgem»(165)
500. A isso objecta-se, por vezes, que a Escritura menciona irmãos e irmãs de Jesus
(166). A Igreja entendeu sempre estas passagens como não designando outros
filhos da Virgem Maria. Com efeito, Tiago e José, «irmãos de Jesus» (Mt 13, 55),
são filhos duma Maria discípula de Cristo (167) designada significativamente como
«a outra Maria» (Mt 28, 1). Trata-se de parentes próximos de Jesus, segundo uma
expressão conhecida do Antigo Testamento (168).
501. Jesus é o filho único de Maria. Mas a maternidade espiritual de Maria (169)
estende-se a todos os homens que Ele veio salvar: «Ela deu à luz um Filho que
Deus estabeleceu como "primogénito de muitos irmãos" (Rm 8, 29), isto é, dos fiéis
para cuja geração e educação Ela coopera com amor de mãe» (170).
A MATERNIDADE VIRGINAL DE MARIA NO PLANO DE DEUS
502. O olhar da fé pode descobrir, em ligação com o conjunto da Revelação, as
razões misteriosas pelas quais Deus, no seu desígnio salvífico, quis que o seu Filho
nascesse duma virgem. Tais razões dizem respeito tanto à pessoa e missão
redentora de Cristo como ao acolhimento dessa missão por Maria, para bem de
todos os homens:
503. A virgindade de Maria manifesta a iniciativa absoluta de Deus na
Encarnação. Jesus só tem Deus por Pai (171). «A natureza humana, que Ele
assumiu, nunca O afastou do Pai [...]. Naturalmente Filho do seu Pai segundo a
divindade, naturalmente Filho da sua Mãe segundo a humanidade, mas
propriamente Filho de Deus nas suas duas naturezas» (172).
504. Jesus é concebido pelo Espírito Santo no seio da Virgem Maria, porque Ele é
o Novo Adão (173), que inaugura a criação nova: «O primeiro homem veio da terra
e do pó: o segundo homem veio do céu» (1 Cor 15, 47). A humanidade de Cristo é,
desde a sua conceição, cheia do Espírito Santo, porque Deus «não dá o Espírito por
medida» (Jo 3, 34). É da «sua plenitude», que Lhe é própria enquanto cabeça da
humanidade resgatada que «nós recebemos graça sobre graça» (Jo 1, 16).
505. Jesus, o novo Adão, inaugura, pela sua conceição virginal, o
novo nascimento dos filhos de adopção, no Espírito Santo, pela fé, «Como será
isso?» (Lc 1, 34) (175). A participação na vida divina não procede «do sangue, nem
da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus» (Jo 1, 13). A
recepção desta vida é virginal, porque inteiramente dada ao homem pelo Espírito.
O sentido esponsal da vocação humana, em relação a Deus (176), foi perfeitamente
realizado na maternidade virginal de Maria.
506. Maria é virgem, porque a virgindade é nela o sinal da sua fé, «sem a mais
leve sombra de dúvida» (177) e da sua entrega sem reservas à vontade de Deus
(178). É graças à sua fé que ela vem a ser a Mãe do Salvador: «Beatior est Maria
percipiendo fïdem Christi quam concipiendo carnem Christi – Maria é mais feliz por
receber a fé de Cristo do que por conceber a carne de Cristo» (179).
507. Maria é, ao mesmo tempo, virgem e mãe, porque é a figura e a mais perfeita
realização da Igreja (180): «Por sua vez, a Igreja, que contempla a sua santidade
misteriosa e imita a sua caridade, cumprindo fielmente a vontade do Pai, torna-se
também, ela própria, mãe, pela fiel recepção da Palavra de Deus: efectivamente,
pela pregação e pelo Baptismo, gera, para uma vida nova e imortal, os filhos
concebidos por acção do Espírito Santo e nascidos de Deus. E também ela é
virgem, pois guarda fidelidade total e pura ao seu esposo» (181).

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